Eu estava dormindo quando o telefone tocou. Era o Namorido. Já faziam duas semanas que ele estava Índia. O que o Namorido estava fazendo na Índia? Eu respondo. Ele trabalha como consultor de negócios e tecnologia. Ele propõe soluções tecnológicas para negócios. Depois de estudar os problemas do cliente, ele projeta uma solução e manda para os programadores terceirizados na Índia. O projeto no qual está trabalhando atualmente estava atrasado na parte de programação, então a empresa do Namorido resolveu mandá-lo à Índia para resolver o pepino.
A viajem deveria durar duas semanas, mas no meio da segunda semana, ele foi informado que teria que ficar sete dias a mais do que o combinado. Naquela manhã, quando ele me acordou, sua voz não parecia das melhores: “vou ficar mais uma semana; agora seriam quatro semanas, completando um mês na Índia, um mês sem a gente se ver!” Eu disse que sentia muito, por que ele ligava todo dia para reclamar de Mumbai, a cidade onde ele estava. Desliguei o telefone e voltei a dormir.
Assim como a viajem do Namorido, algo na minha vida vinha se prolongando mais do que o esperado! Eu estava a quatro semanas lutando inutilmente contra uma crise de herpes que tinha aparecido nos meus lábios, providencialmente na semana do meu aniversário. Depois de passar o meu aniversário todo segurando a boca para não sorrir, por causa da dor que aquilo causava na herpes, eu tinha ganho o apelido de Botox Girl. Meus dotes de maquiadora era tão bons que ninguém conseguia ver os ferimentos, assim meus amigos concluíram que a herpes era uma mentirinha que eu tinha inventado para não admitir que eu tinha feito Botox! Já faziam uma semana e meia que eu não trabalhava, minha herpes continuava a se espalhar e tinha chegado a me deixar sem comer nada sólido por dias. Na tentativa de acalmar meu estresse, maior vilã em caso de herpes, eu tinha tirado uma folga por tempo indeterminado!
Lá estava eu na cama tentando dormir depois de ser acordada pelo Namorido, quando o telefone tocou novamente. Era ele de novo. “Ei, você quer vir pra cá?” Eu ainda estava dormindo, por isso demorou um pouco para entender que eu estava sendo convidada para ir para a Índia! O hotel estava sendo pago pela empresa, o vôo seria pago com milhagens, e tudo em Mumbai era bem barato, a viagem sairia quase de graça. Havia um porém: eu tinha dois dias para me organizar e isso incluía tirar o visto e tomar todas as vacinas para as doenças asiáticas, às quais eu não havia sido exposta na vida!
Wow hoooo!!!! Eu vou para a Índia, não me agüentei e mandei um e-mail para vários amigos e para os meus pais! Organizei a papelada e fui à embaixada indiana; deixei os papéis para voltar no outro dia para buscar o visto. Papelada entregue, era a hora de enfrentar a pior parte: as vacinas! Descobri doenças que eu nem sabia que existiam, como a Encefalite Japonesa!
Depois de toda perfurada por várias vacinas, eu estava pronta para a Índia. Como eu tive pouco tempo para organizar a viagem, faltou tempo para ficar nervosa. Antes que eu tivesse tempo para isso, eu estava no portão de embarque, cercada por indianos! Um rapaz se aproximou e começou a conversar comigo. Foi quando eu descobrir que os indianos são falantes e gostam de interagir! Quando ele me perguntou onde eu estava sentada, eu tive uma surpresa. Ele disse: “Meu assento é 40 D, qual é o seu?” Eu abri a passagem e disse: “2K”. Os olhos do rapaz se arregalaram e ele disse: “Primeira Classe?” Eu respondi que não, mas ele balançou a cabeça e disse que sim, eu estava na primeira classe. Achei estranho, entrei no avião, muito desconfiada. O comissário de bordo percebeu minha dúvida e perguntou qual era o número do meu bilhete. O rapaz estava certo, era primeira classe. Eu não entendi, mas não reclamei. Sentei na minha poltrona enorme e me preparei para 14 horas de bajulação!
Era um absurdo! Primeira classe é um milhão de anos luz separado da classe econômica, tudo exageradíssimo. A poltrona era maravilhosa, enorme, reclinava até quase deitar; TVs individuais, luzes para leitura que vinham de todos os ângulos possíveis e imagináveis. Até ai eu estava bem, mas quando a bajulação começou, eu fiquei chocada. Era tanta comida! O jantar era uma refeição de quatro, cinco pratos: entrada, salada, prato principal, queijos e frutas e por último, sobremesa! Isso tudo regado a vinho, champagne, wiskey, cerveja,... quando eu cheguei na sobremesa, eu tive que recusar o sunday, sobe o olhar descrente da aeromoça! Antes de aterrissar, veio o café da manhã! Outra orgia gastronômica! Eu fiquei pensando se não podia existir uma coisa, tipo classe média, no avião. Um pouquinho mais de espaço e uma comidinha um pouco melhor era suficiente, porque aquele exagero me fazia sentir mal! Bem, mas parece que assim como na sociedade brasileira, a classe média foi espremida!
Cheguei em Mumbai sem conseguir nem me mexer, de tão cheia pelo absurdo de comida! Passei pela imigração; peguei minha bagagem. E resolvi ajudar a menina que estava na poltrona do lado da minha. Elas estava mudando para Índia e, por isso, tinha milhões de malas. Quando nós duas saímos pelo portão de desembarque encontramos um mar de pessoas. Eu logo avistei o Namorido e um senhor indiano num uniforme branco segurando uma placa que dizia: Mrs. Laura Barreto. A garota que eu ajudava avistou seu namorado ao mesmo tempo. Na saída, o homem que segurava a placa com meu nome começou a pegar a bagagem da garota. Ela teve que explicar para o senhor que ela não era Laura.
O senhor era o motorista do hotel. Como o Namorido não sabia se conseguiria ir me buscar, ele contratou um motorista do hotel, mas acabou saindo mais cedo do trabalho e o acompanhando ao aeroporto. O senhor era uma graça. Me chamava de madame. Era madame pra cá, madame para lá e depois de todo o tratamento de primeira classe do vôo, eu estava achando aquilo muito engraçado! Principalmente depois de ter arrastado minha mala por NYC no metrô até o aeroporto, subindo e descendo escada, com aquele peso todo. Em menos de 24 horas eu sai de garçonete em NYC para Madame na Índia e tudo isso por causa de um vôo de primeira classe!